"O que diferencia «uma mudança reformista» de «uma mudança não reformista» num regime político, é que no primeiro caso o poder continua fundamentalmente nas mãos da antiga classe dominante e que no segundo o poder passa das mãos dessa classe para uma nova."

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Terras «com dono conhecido» também ardem

Fogos não pouparam o Pinhal de Leiria nem o Parque Natural da Serra da Estrela

Zona do Pinhal de Leiria consumido pelas chamas de dia 15 de Outubro e onde se estima que tenha ardido mais de 80% da sua área, Marinha Grande. 17 de Outubro de 2017Créditos - Miguel A. Lopes / Agência LUSA

Os incêndios destes dias demonstram de forma crua, mais do que um problema com as terras «sem donos conhecidos», há falta de meios públicos na protecção do património florestal, a começar pelo que é público.

De acordo com os dados do Sistema Europeu de Informação de Incêndios Florestais (EFFIS, na sigla em inglês), arderam mais de 200 mil hectares entre domingo e esta manhã no nosso País. Este valor é equivalente a toda a área ardida em Portugal do início do ano até 30 de Setembro, de acordo com o último relatório do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Durante a discussão do pacote florestal do Governo na Assembleia da República, um dos pontos que gerou maior debate foram as terras ditas «sem dono conhecido» e o destino a dar-lhes. Não se conhece a extensão destas áreas, já que o cadastro florestal não foi ainda feito – o anterior governo não o fez, canalizando os 700 milhões de euros necessários para a redução do défice das contas públicas e o pagamento da dívida.

A solução proposta pelo Executivo e subscrita pelo BE, que foi chumbada, passava pela concentração destas terras num banco de terras público, mas podendo ser colocadas à disposição de privados, através de arrendamento de longo prazo.

No entanto, a análise das áreas ardidas este ano, e particularmente nos últimos dias, mostram que grande parte destas correspondem a terras com dono conhecido, e bem conhecido.


Mais de 15% da área ardida sofreu directamente com cortes nos meios públicos

O Corpo de Guardas Florestais foi extinto em 2016.

Por proposta do PCP, a sua recriação foi incluída no Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios aprovado em Julho pela Assembleia da República

Até 30 de Setembro, mais uma vez de acordo com o relatório do ICNF, 16% da área ardida corresponde a terras sob gestão desta instituição pública fustigada pelos cortes orçamentais nos últimos anos. Os meios públicos para a prevenção contra incêndios foram sendo debilitados ao longo dos últimos anos, seja através da extinção do Corpo de Guardas Florestais ou o sucessivo adiamento da constituição de 500 equipas de sapadores florestais.

Mas os últimos fogos mostram de forma mais crua esta realidade e a necessidade de um reforço efectivo de meios técnicos, humanos e financeiros para a defesa da floresta, nomeadamente as áreas sob gestão pública.

Matas nacionais dizimadas nos últimos dias


O incêndio que se iniciou no concelho de Alcobaça fez arder quase 12 mil hectares. Destes, a esmagadora maioria corresponde às mata nacionais de Leiria, de Pedrógão e do Urso, áreas de propriedade pública e sob gestão do ICNF.

Mas também em áreas protegidas, também geridas pelo ICNF, arderam largas extensões. No Parque Natural da Serra da Estrela, deflagraram dois incêndios florestais no último domingo, nos concelhos de Gouveia e de Seia. Em conjunto, de acordo com o EFFIS, estes fogos estenderam-se por mais de 15 mil hectares, cerca de dois terços dos quais (dez hectares) dentro do perímetro do Parque Natural.

Para além destas, há outras áreas protegidas ou de propriedade pública que arderam em menor dimensão, como são os casos da Mata Nacional das Dunas de Quiaios, na Figueira da Foz, em que arderam pelo menos 30% dos seis hectares que a compõem; as matas nacionais das dunas de Vagos e da Gafanha (Ílhavo); grande parte da Paisagem Protegida da Serra do Açor; uma pequena parcela do Parque Nacional da Peneda-Gerês.

As terras «sem dono conhecido» têm sido ao longo dos anos um dos argumentos a que se recorre amiúde para justificar situações que, apontam os dados, resultam de falta de meios para a prevenção e defesa da floresta contra incêndios – a começar pelo património florestal que é público.



1 comentário:

Anónimo disse...

"Regresso à questão que lhe pus em Julho: está disposto a gastar na Floresta e na agricultura familiar tanto como o Estado gastou na salvação do Banif? (...)
As pessoas têm que estar primeiro que o défice!
Se assim for, estaremos a prestar a melhor homenagem aos que perderam a vida, os seus bens, a sua habitação, a sua empresa e a sua produção." Jerónimo de Sousa