Os tempos que vivemos são interessantes para um economista. Isto é dito do mesmo modo como um médico poderia dizer que um tumor é algo "interessante". Os acontecimentos de Chipre ensinam lições. Em primeiro lugar deve-se assinalar o descalabro da Europa dos monopólios: O confisco de depósitos bancários é algo mais próprio do Terceiro Mundo do que de um país da União Europeia. Terem eles chegado a medidas deste tipo mostra o desespero em que se encontra o capital monopolista e financeiro europeu. Em segundo lugar, deve-se verificar o fracasso dos seus planos. O endividamento é a forma moderna de submeter à servidão países como Chipre, Grécia, Portugal, etc. O objectivo é transformarem-nos em pasto do capital monopolista e financeiro para o saqueio (através de privatizações selvagens) e da extracção permanente de rendas. Isso fracassou porque não tiveramcash suficiente para cobrir a dívida cipriota. E agora surge a jogada de mestre russa, com a oferta da Gazprom de cobrir a dívida cipriota. Ela é digna dos melhores jogadores de xadrez. A UE queria reservar o saqueio de Chipre só para os monopólios da Europa ocidental – não para os russos. A oferta russa veio estragar-lhes os planos. Bruxelas terá de contorcer-se toda a fim de encontrar uma justificação para a recusa. E já vai dando instruções ao seu preposto local na presidência de Chipre para dizer que prefere uma "solução europeia". Aguardemos os próximos capítulos.
21/Mar: Os acontecimentos precipitam-se tão rapidamente que mal dá tempo de acompanhá-los. O congelamento dos depósitos bancários ("corralito", como dizem os argentinos) irá prolongar-se até 3a. feira próxima. O ministro das Finanças de Chipre está em Moscovo a negociar – e para lá segue, às pressas, o próprio presidente da Comissão Europeia, sr. Durão Barroso. A sua corrida para Moscovo dá ideia da importância que a UE concede à "ameaça" da oferta russa. Enquanto isso o BCE apresenta um "ultimatum" a Chipre. As pressões intensificam-se. A crise monetária e financeira transforma-se, aparentemente, numa luta por esferas de influência. O caso torna-se cada vez mais interessante (no sentido mencionado acima). Registe-se que o prestígio dos políticos cipriotas aumentou com o seu repúdio ao acordo da Troika. A comparar com o prestígio daqueles políticos portugueses, gregos, irlandeses, espanhóis e italianos que se submeteram e submetêm-se servilmente às imposições da UE, BCE e FMI.
23/Mar: O drama psico-monetário continua. Agora é Medvedev que ameaça despejar as reservas em euros do banco central da Rússia, subtituindo-as por dólares. Se o BC russo se desfizer de apenas metade das suas reservas de euros, isso significará a ruína da moeda única europeia. Um escritor de ficção não conseguiria imaginar uma estória com tanto suspense e tais desenvolvimentos. É assim que Chipre, cujo PIB representa 0,3% do PIB da UE, ameaça fazer ruir o castelo de cartas do sistema bancário europeu.